Por Paulo Ricardo
‘O Que Ficou Para Trás’ deu ao seu diretor, Remi Weeks, o prêmio de Melhor Estreia de um Diretor Britânico no BAFTA, o Oscar inglês, deste ano. Um prêmio pra lá de merecido.
Trata-se de um filme devastador que surfa na onda de filme social contado no gênero de terror.
Já na sequência inicial acompanhamos o jovem casal Bol e Rial (Sope Dirisu e Wunmi Mosaku em interpretações arrebatadoras) e a pequena Nyagak fugindo desesperados da guerra no Sudão do Sul. Eles buscam atravessar o oceano a procura de abrigo na Inglaterra, num frágil barco pesqueiro carregado de corpos negros e que não resiste às tormentas do mar. Há um naufrágio, e da pequena Nyagak só restará sua boneca.
Essa informação, que de início não sabemos se é apenas um sonho, pesadelo, realidade ou tudo isso junto, é narrada com esse artifício de espacialidade temporal usado com maestria no desenrolar da história, enquanto acompanhamos o casal de refugiados que foi resgatado por instituições britânicas que lhe fornecem uma casa – ‘his house’ do título original. Mas tantas regras são impostas para uma boa convivência no novo lar que mais parece que eles vivem agora numa prisão a céu aberto. A tentativa do casal em se adaptar na casa habitada pelos fantasmas e sombras do que ficou para trás – feliz escolha do título brasileiro – é o mote do roteiro.
Os sustos mais contundentes da história não nos são oferecidos apenas pelos monstros ou fantasmas, mas, sim, pelos acontecimentos da realidade que os cercam.
É incrível o peso dos mortos diaspóricos que estão no fundo dos oceanos e que têm sido trazidos à superfície pelo cinema contemporâneo para uma espécie de acerto de contas – vide o recente ‘Atlantique’.
O terror psicológico de ‘o que ficou pra trás’ é um mergulho no misticismo africano e é puro afro-surrealismo, o que o diferencia sobremaneira dos filmes do gênero.
Tá na netflix, então #FicaEmCasa e aproveita.
Em tempo: ‘Atlantique’ também está no catálogo da Netflix, dá pra fazer uma sessão dupla.
Fotos: Reprodução.