Por Paulo Ricardo
Já nas primeiras sequências do filme de Jane Campion somos apresentados ao que parece ser uma típica história de faroeste, mas descobrimos assombrados que a velha história de vingança tem uma roupagem nova. E a diretora parece explicitar esse conceito lançando mão de peças de figurinos, em sequências contundentes, como quando a câmera acompanha os passos pesados de Phil enquanto o som das botas no piso ressoa no quarto ao lado, onde encontram-se os oprimidos Peter e sua mãe. Como contraponto, o Conga branco de Peter, comprado no Magazine do povoado, parece anunciar o novo que vem, que sempre vem – a despeito de todo conservadorismo ele vem seguro. Aqui, para substituir as pesadas botas que carregam o peso da masculinidade tóxica dos cowboys.
“Você não tem botas?”
“Tenho”
“Então use-as. Não deixe sua mãe lhe fazer de maricas”
Desde a sequência inicial, somos apresentados ao grande mito Bronco Henry, venerado por Phil e padrão de masculinidade sobre a manada. É a partir dessa mitologia que Phil exerce seu poder ao seu redor. E assim tem o seu mundo estabelecido, ao menos até a chegada da sua cunhada e seu enteado ao rancho. Seguimos a história dos irmãos, Phil e George, de Rose e o sensível Peter, que tem as mãos hábeis tanto para criar uma flor quanto dissecar um animal. A solidão dos personagens dá o tom. O convívio dos quatro na fazenda transforma a vida de Phil por completo e sua relação com o Peter é o principal pivô da mudança.
Jane Campion conta sua história carregada de tensão e segredos por trás de paredes e portas, e só aos poucos conseguimos desvendar as camadas da história. Um filme de mestre.
Tá na Netflix.
Fotos: Reprodução.