Por Arlindo Grund e Lari Mariano
Mais um dia de moda, contemporaneidade e reflexões. A moda como ferramenta de comunicação traduz muito mais do que o vestir. A roupa, usada como instrumento potencializador de vozes, reforça o papel social da moda.
A musicalidade foi inspiração para o primeiro desfile no quarto dia. A Ken-gá trouxe à edição 47 da Casa de Criadores a coleção Brasil Surreal, inspirada no Brás e no funk – metalizado em dourado, jeans de cinturas baixas, pele à mostra com ilhoses e amarrações, modelagens justas e colorido foram os destaques da marca.
Entrelaçar: o que essa palavra pode dizer sobre as histórias da moda? Nessa reflexão a Thear trouxe sua apresentação. Uma narrativa construída a partir de um fio de linha de algodão — a matéria-prima do processo realizado pelo tear manual das mulheres do projeto Tecendo a Liberdade, que fazem esse trabalho dentro de um presídio. Um fio que ganha valores de conexão, de unir mulheres e contar para mulheres, como o vídeo diz. As tramas coloridas são um resgate do fazer à mão e tudo compõe um novo significado para o ressignificar.
Ainda sobre resgates, o da Reptilia se fez com o passado. Em sua apresentação “Estamos Quase Lá”, a marca celebrou o processo dos seus sete anos de existência até o momento atual: algo como o conceito de “lembrar do que somos para viver o que seremos”. E, nestes anos, resgata seus retalhos para transformá-los em peças de formas orgânicas, amplas e de linhas retas. O quase simples, que mostra a diferença nos detalhes.
Para além dos figurinos coloridos, com texturas e estampas, o Ateliê Vou Assim fez seu filme com um cunho social. O projeto, que realiza ações propositivas de empregabilidade, representatividade e demandas da sociedade e cultura LGBTQIA+, apresentou serTRANSneja, um filme que mostrou, no sertão da Bahia, um mapeamento de pessoas, entre costureiras, performers, produtoras e fotógrafas, todas envolvidas com suas histórias e trabalhos na produção.
Como resultado de uma “terapia de confinamento forçado”, nas palavras da artista visual Marcella Maiumi, a Shitsurei apresentou sua coleção-cápsula, Resident of Chaos, unindo moda à arte e aos tempos atuais. As peças são todas pintadas à mão, desde conjuntos de moletom a casacos, todos com ares mais esportivos na modelagem.
Teoria das Cores, de David Lee, explorou a leveza. A alfaiataria, como destaque, apareceu mais revisitada e desconstruída. Formas mais amplas brincaram com assimetrias, encontrando os multicoloridos trabalhos em crochê, em tons muito vivos de laranja, vermelho e amarelo, por exemplo. Nesse cenário, complementado com estampas abstratas, a presença do branco parece agir como uma tela: à espera de receber cor.
Weider Silveiro trouxe como conceito o cruzo, um encontro entre diferentes saberes, quase como falar sobre um equilíbrio interno. Na criação, em toda peça ou tecido, seja nos blazers, casacos, xadrezes, paetês ou no camuflado militar, há em comum uma estética utilitária: presença de bolsos com zíperes e contrapontos de pesos, assim como o equilíbrio entre físico e digital na apresentação.
Fotos: Divulgação/ Casa de Criadores.